Se você nunca se viu num momento de desespero, nem leia essa crônica, talvez não a entenda. Tenho pensado na quantidade de pessoas que querem morrer ou matar por aquilo que dizem ser amor. Sempre existiram histórias assim, de amor e ódio, mas creio que agora elas têm me chamado mais a atenção.
Temos visto pais espancarem por amor. Mulheres sendo violentadas por amor. Homens serem agredidos por amor. Mas que tipo de amor é esse? Nós, profissionais da área de saúde, chamamos isto de amor neurótico.
Mas o que é um amor neurótico? É um amor recheado de ilusões. Um amor de “faz de conta”, que primeiro nega qualquer dificuldade ou incompatibilidade para ser protegido. Depois, num rompimento brusco, quebra a idealização e o parceiro ou parceira não quer mais.
Passamos assim para a segunda fase do amor neurótico. É a fase do narcisismo ferido. A fase do egoísmo, da não aceitação da rejeição e, então, o desespero ou a loucura. Desespero ou loucura? Difícil em alguns momentos mensurar e rotular o que seja um ou outro.
Onde está o limite, a diferenciação do que seja desespero ou loucura? A minha dúvida é um dos motivos pelos quais jamais poderia ser advogada ou promotora, quanto menos juíza. Julgar um momento assim é um risco muito grande.
Amar loucamente é uma armadilha formada por labirintos, jogos de azar, artimanhas que aprisionam, massacram e, principalmente, condenam a um ou a ambos que já viveram no céu, a passarem rapidamente ao inferno. Amar loucamente é labirinto que não se vê saída. Amar loucamente é sentir-se perdido, é agir perdido de si mesmo. Fora dele está o alívio, mas fora dele o que se vê é a morte.
Quando temos um amor neurótico, perdemos a cumplicidade e negamos a realidade. O que queremos neste tipo de amor é sermos dono. O amor que quero é para mim, do meu jeito, agora e pronto! Como podem ver, é um amor infantil que não suporta a palavra não. Amor baseado na força e no medo não é amor, é posse. Amor alimentado na fantasia não é amor, é manipulação do próprio coração ou, pior, é manipular o coração do outro.
Os homens da lei dirão que sempre sabemos claramente quem é vítima e quem é algoz. Para mim isto não é bem claro. Quem agride já foi muito agredido, muito abandonado e muito violentado internamente.
Conheço pessoas que brincam de amor. Brincam sem o menor pudor do que isto venha a causar no outro. Isto justifica agressão? Claro que não. A maneira de evitar este tipo de agressão deve ser evitando este tipo de relacionamento. Evitando amores neuróticos evita-se agressão neurótica. Evitar amores infantis, que aparentemente são vingados e acabados com a condenação de alguém, mas que não mudam em nada o comportamento dos envolvidos.
Também não mudam as histórias que se seguem se cada um não abrir mão de querer viver no céu, vivendo as delícias do amor neurótico, fundido, simbiótico, vicioso e, conseqüentemente, louco.