Eu tenho um espelho enorme no meu quarto, destes que vão do teto ao chão. Ele reflete tudo com uma riqueza de detalhes que me pergunto onde eu estava com a cabeça quando decidi colocar o meu pior algoz dentro do meu próprio quarto.
Cada vez que cruzo por ele, quando vou me trocar ou me preparar para ir para o banho, dou uma espiadinha com o canto do olho, paro alguns segundos, me observo e sempre enxergo algo que não gostaria de ter visto.
E, assim como eu, milhares de mulheres têm seus espelhos inconscientes. O efeito da gravidade é implacável para qualquer um, mas para as mulheres é pior. Homens e mulheres podem ter celulite ou flacidez, mas para as mulheres tem um peso diferente.
As rugas vão aparecer e revelar a passagem do tempo naturalmente para qualquer pessoa, mas para as mulheres é como se com perda da juventude escorresse por entre os dedos também o direito de se sentirem bonitas, atraentes, desejáveis e até relevantes.
Meninas muito jovens têm vergonha do próprio corpo e começam desde cedo a se submeter a procedimentos estéticos para se sentirem adequadas e aceitas em um mundo onde o padrão é praticamente impossível de alcançar.
Mulheres maduras investem seu tempo e dinheiro para parecer cada vez mais jovens e enganar o tempo, mesmo que para isso tenham que enganar a si mesmas.
Trampolim já impulsionou centenas de mulheres com consultorias
O dia 8 de março chegou e com ele o mundo se propõe a refletir sobre as conquistas que todas aquelas que nos antecederam nos proporcionaram viver hoje. Relembramos o passado de lutas e sacrifícios e é inevitável pensar em tudo o que ainda precisamos evoluir enquanto sociedade.
Mas neste dia 8 de março, no ano de 2024, em pleno século XXI, a nossa luta já ultrapassou o direito ao voto, ao trabalho, ao divórcio. A nossa luta, a luta de todas nós mulheres, passa pelo direito de ser quem somos, sem o peso das comparações e de todos aqueles julgamentos, que na grande maioria das vezes é de mulher para mulher.
Precisamos nos unir para não termos que nos adequar a um lugar que nem sabemos se queremos ocupar de fato: o da perfeição.
É hora de quebrar estes espelhos imagéticos, que refletem apenas uma imagem superficial de quem somos, e começar a ocupar cada cantinho de nós mesmas, para, então, abrir espaço para nos dedicarmos a lutar pelo que realmente importa neste 8 de março: ocupar os espaços de fato.
Há tanto a fazer. Existem tantas áreas em que somos minoria. Tecnologia, política, economia, engenharia, ciência. As principais mudanças que o mundo vai viver nos próximos cem anos passam por essas áreas e, se não começarmos agora a ocupar o nosso lugar, talvez não estejamos lá para decidir. E mais uma vez ficaremos assistindo a tudo pelo espelho, mas desta vez o retrovisor.
*Lola Carvalho é esposa, mãe de dois, escritora, apresentadora do programa Mulher de Fases, na Vale TV e apaixonada pelo cotidiano feminino.