“Minhas fases. Nossas fases.” O tratamento do câncer é um tratamento de fases. Os pacientes – sempre vencedores, garantem isso. E lutam para que essas fases se concluam, para o momento mais esperado para todos: a vitória. E essa vitória não é só do paciente: mas da esposa (o), dos filhos, do tio, da tia… do maior patrimônio: a família.
Mas, para chegar lá, o processo é longo. É dolorido. E de muitos obstáculos.
E, para os pacientes de câncer de Novo Hamburgo surgiu um grande obstáculo: ir, ao minímo uma vez por semana a Taquara, distante a 45km de Novo Hamburgo, para receberem sua esperança de vida. São mais de 600 pessoas nesta situação – além dos novos casos, que seguem adentrando o Sistema Único de Saúde diariamente.
Claudia Regina Pasa é um exemplo. Moradora de Novo Hamburgo, ela descobriu seu primeiro câncer em 2019. “Fiz a primeira cirurgia no dia 18/09/2019, no Hospital Geral, onde foi confirmado um tumor na mama. Desde lá, luto por isso“.
Claudia conta que, no dia 23/12/2019, fez outra cirurgia para ampliar margem já no Hospital Regina, referência na oncologia. “Em 20 de janeiro de 2020, fiz mastectomia total da mama esquerda, com colocação de prótese. Porém, como minha mama direita é bem maior que a prótese, recebi a promessa de redução, logo após os ciclos da quimioterapia“. Claudia fez os ciclos, e a confirmação veio. Só que com um adendo: a pandemia atrasaria seu procedimento, pelos riscos por conta da Covid-19.
As fases do tratamento de Claudia. Arquivo pessoal
Mas, a esperança veio. No último dia 5 de abril, ela recebeu o retorno: sua cirurgia iria ocorrer no Hospital Regina, no próximo dia 16 de maio. E foi na terça-feira que ela recebeu uma ligação: seu caso seria transferido para Taquara. “Eles sequer tem meu histórico. No dia 28 de maio, há uma consulta com a mastologista. Não há hora marcada. Somente ordem de chegada. Vou ter que ir cedo, e esperar. Mas minha esperança diminui”, conta. “Queria muito fazer com a dra. Gabriela Santos. Tenho um carinho enorme por ela. E nós, que passamos por isso, sabemos a importância de um médico”, disse ela.
‘O TRATAMENTO TINHA QUE SER AQUI”
Maria Lorena Queiroz de Souza, de 55 anos, também tem um longo histórico de luta. Fazendo exames de rotina, descobriu, no ano passado, que possuía câncer na mama. Lorena, então, após vários exames, começou seu tratamento quimioterápico em janeiro, no Hospital Regina. “Quando descobri, perdi o chão. Só o paciente sabe o que é estar com o câncer. Não é fácil. É uma luta diária”, comenta.
Lorena também também terá de buscar seu tratamento em Taquara. “Acho uma vergonha Novo Hamburgo não ter seu tratamento aqui. Como ninguém se mexeu antes?”, desabafou.
Lorena ainda fala: “Nós que passamos pela quimioterapia, sabemos o que é isso. Como vamos voltar de van, depois desse difícil processo?“, questiona.
CAMPO BOM
Em Campo Bom, os números atestam o impacto positivo da troca de referência da oncologia para o Hospital Bom Jesus, em Taquara. No início de dezembro do ano passado, quando as consultas oncológicas do SUS ainda eram realizadas no Hospital Regina, em Novo Hamburgo, em torno de 80 pacientes campo-bonenses esperavam por atendimento, alguns há mais de quatro meses. Hoje, todos que aguardavam naquele momento já foram atendidos e apenas 13 pessoas esperam agendamento de consulta, nenhum há mais de 30 dias.
RELATOS
A reportagem também recebeu relatos de pessoas que já foram a Taquara em busca do tratamento. “Acordei as 6h de manhã e voltei ao meio dia, Essa lógica dói na gente”, disse uma paciente de câncer hamburguense, que já foi atendida em Taquara.
Outro paciente disse que no município só há um urologista. “Fui diagnosticado com neoplasia renal. Tive encaminhamento para o hospital de Taquara, pois Novo Hamburgo não iria mais atender oncologia. Até agora, tive só a consulta e exames feitos pré-operatórios, mas nenhum procedimento foi feito. O hospital de Taquara só tem um urologista atendendo uma vez na semana e com certeza não dará conta da demanda”, disse ele. O paciente elogiou os funcionários, mas se preocupa com atrasos que poderão vir por tamanha demanda, além da logística.
UM PLENÁRIO, VÁRIAS LUTAS
Quem esteve na Câmara de Vereadores, na semana passada, se emocionou com tantas histórias de pacientes. Eram dezenas. Quando a presidente da Liga, Regina Dau, falou, muitos vieram a chorar. “Eu vi minha vida passando pela fala dela. E vi a vida de outros pacientes. Tem pessoas que não tem o que comer em meio ao tratamento. Que já tinham ajuda em Novo Hamburgo, pela Liga. E agora, farão o que?“, disse uma paciente, emocionada.
A LUTA NÃO PARA
Os gestores públicos do Vale do Sinos e de Novo Hamburgo precisam se inspirar na Liga Feminina de Combate ao Câncer. Afinal, enquanto uns ficam parados, essas lideranças femininas querem trazer a oncologia de volta para Novo Hamburgo. Quem mais está procurando soluções para o problema, quem mais está correndo contra o tempo. “Não vamos parar, pois essa é uma luta pela vida”, diz Regina Dau, da LFCC. A Liga é um exemplo de entidade.
E essa luta não vai parar. Afinal, estamos falando de vidas. De pacientes e histórias de luta.