Presidente do Movimento Pró-Dique da Feitoria Josué Passos mobiliza moradores, poder público e entidades sociais em defesa da prevenção contra enchentes e da sustentabilidade no Vale do Sinos.
Filho de seu José e dona Clair, criado pela mãe após a separação dos pais, Josué Passos da Silva cresceu enfrentando dificuldades que marcaram profundamente sua vida. Foi a partir dessas experiências que ele encontrou no voluntariado e no engajamento social o caminho para transformar dor em propósito. Hoje, aos 40 anos, pai do Bernardo e da Leandra e companheiro de Áurea, Josué é presidente do Movimento Pró-Dique da Feitoria, organização criada em junho de 2024 e que se tornou referência na luta por proteção contra enchentes em São Leopoldo.
Da dor pessoal ao engajamento comunitário
A trajetória de Josué é marcada por superação. A morte da mãe, vítima de depressão, o levou a buscar nas terapias integrativas uma forma de compreender e auxiliar outras pessoas. Formado em Processos Gerenciais, História e atualmente cursando Gestão Ambiental na Unisinos, ele também atua como terapeuta, oferecendo reiki, apometria e numerologia, sempre com foco no cuidado humano.
No campo social, sua primeira experiência foi como educador em programas voltados a famílias do Bolsa Família. Ali, descobriu a vocação para atuar com comunidades vulneráveis, discutindo temas como saúde, meio ambiente e inclusão. “Foi uma escola de vida. Aprendi que só mudamos realidades quando estamos dispostos a nos envolver”, afirma.
O nascimento do Pró-Dique
Em 2024, a enchente que atingiu São Leopoldo mudou o rumo da vida de Josué. Sua própria casa, no bairro Independência, foi uma das últimas a ser alagada. A tragédia motivou a criação do Movimento Pró-Dique da Feitoria, reunindo moradores em assembleia no dia 11 de junho daquele ano.
“O prefeito falava em ampliar diques na Vicentina, Campina e Scharlau, mas a Feitoria continuava sem nenhuma proteção. Foi daí que surgiu nossa mobilização: da necessidade de um dique próprio”, recorda. Desde então, o Pró-Dique passou a articular reuniões com moradores, autoridades e órgãos ambientais, tornando-se voz ativa na defesa da prevenção contra enchentes.
Expansão e articulação regional
O movimento começou na Feitoria, mas logo se expandiu. Núcleos foram criados na Vicentina, Campina, Rio dos Sinos e Fênix, além do Pró-Dique Mulher, formado para dar protagonismo às mulheres na luta comunitária. “As mulheres foram muito atingidas pelas enchentes. São elas que cuidam da casa e da família, e precisavam de um espaço próprio para suas pautas”, explica Josué.
Hoje, o Pró-Dique mantém sede junto à Assemplife, entidade parceira desde a fundação, e trabalha em rede com outras organizações sociais, como a ONG Semeando, no bairro Fênix. A meta é ampliar parcerias com o terceiro setor, prefeitura e universidades, fortalecendo a capacitação profissional da população e reduzindo a dependência de programas assistenciais.
O diálogo com o poder público
A força do movimento não passou despercebida. O Pró-Dique mantém reuniões mensais com a Câmara de Vereadores de São Leopoldo, sob liderança do vereador Daniel Daudt, para acompanhar avanços e cobrar providências. Também já esteve representado na Assembleia Legislativa do Estado e dialoga com lideranças de municípios vizinhos como Sapucaia do Sul e Porto Alegre.
Segundo Josué Passos, a principal barreira hoje é o atraso na liberação de projetos ambientais, como o exigido pela Fepam. “Os recursos já estão depositados pelo governo do Estado desde dezembro, mas só poderão ser usados após a liberação ambiental. Enquanto isso, nossas comunidades seguem vulneráveis”, alerta.
A importância estratégica dos diques
Para o líder comunitário, o debate sobre os diques vai além da Feitoria. O projeto previsto inicia na Avenida Imperatriz, passa por Independência, Imigrantes, São Geraldo, Feitoria Nova e se estende até Lomba Grande, em Novo Hamburgo. “Se nada for feito, em uma próxima enchente de mesma intensidade, toda a Feitoria ficará embaixo d’água. O rompimento do dique na Vicentina só reduziu o nível porque desviou a água, mas da próxima vez pode ser pior”, alerta.
Josué Passos defende que o tema seja tratado como prioridade regional. “As enchentes mostraram a fragilidade não só de São Leopoldo, mas também de Novo Hamburgo, Esteio, Sapucaia e Canoas. É uma luta que precisa unir todo o Vale do Sinos e a Região Metropolitana”, acrescenta.
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Sustentabilidade e futuro
Além da luta pelos diques, Josué também atua na Assemplife, entidade que busca unir comerciantes da Feitoria em torno da sustentabilidade e da educação ambiental. Iniciativas como o incentivo à energia solar, a valorização das cooperativas de reciclagem e a adoção de práticas ESG fazem parte da agenda. “Não existe jogar fora. Não existe Terra 2. Precisamos cuidar do que temos hoje”, afirma.
Para ele, o desafio é manter a mobilização viva mesmo após a solução emergencial das enchentes. “Queremos que o Pró-Dique seja permanente, atuando também em habitação, saúde e capacitação das pessoas. Só assim teremos uma comunidade mais resiliente e preparada”, conclui.
Entrevista para o programa Conversa de Peso, com Rodrigo Steffen.