novohamburgo.org – Os professores não vão gostar da avaliação?
Marie Traude – Eu conto como era quando eu entrei no Estado. Nós recebíamos a prova final dos alunos, aquela pra passar de ano, no gabinete da diretora, no dia da prova. E ela vinha direto da Secretaria de Educação. A gente ia pra sala de aula com aquele envelope queimando na mão, preocupada se tinha dado conta de ensinar o que era pedindo ali. Por isso, era lá em cima a educação. E depois, era um orgulho pra gente o desempenho da nossa turma.
Na hora da correção, nós sentávamos em classes paralelas e nós fazíamos a estatística, questão tal com questão tal, pra ver onde havia lacunas pra passar pra professora do ano seguinte. Ali ela tinha que começar. Você vê que há uma coerência, uma lógica dentro dos conteúdos que o aluno tinha.
novohamburgo.org – Seria um método de avaliação viável a ser feito hoje?
A escola nasceu para oportunizar ao aluno a construção do seu conhecimento.
Marie Traude – Eu acho que a avaliação tem que ser feita. Pra haver o resgate da educação, não pensando só no professor, mas no aluno, porque só se pensa no professor e nós temos que pensar no aluno que vai pra escola. O governo também tem que se preocupar que educação se faz em dois pontos: com alunos e professores. Os alunos tem que sair com uma boa bagagem de conhecimento, e o que a gente vê hoje? A gente vê comerciantes que não sabem fazer uma conta, preencher uma nota, não sabem escrever, têm erros. Isso é o ensino. Onde o aluno vai aprender o bom português, a boa matemática? No ensino básico. A escola nasceu para oportunizar ao aluno a construção do seu conhecimento. Então a gente é mediador.
novohamburgo.org – Ainda na questão da educação como negócio, quando uma escola privada determina que nenhum aluno pode ser reprovado, independente do seu desempenho, qual a avaliação que senhora faz?
Marie Traude – Eu digo que isso é mediocrização do ensino, é um ensino medíocre. É a necessidade de agradar o cliente, o cliente é o rei tem que ser agradado. Eu sou totalmente contra. Não colocaria um filho numa escola assim, porque no momento que eu coloquei meus filhos numa escola, eu entreguei numa confiança de que a escola ia fazer pelo meu filho o que eu como família não podia fazer, que é toda essa caminhada de construção do conhecimento. Isso a escola tem que fazer.
Quando a escola aprova e ele não sabe, eu estou sendo enganada. Eu paguei por uma mercadoria que vem com falha. E não é isso que eu quero, porque quando a gente investe, quando eu invisto no meu filho, eu estou colocando uma grande expectativa de que o meu investimento, o lucro dele, é de que o meu filho ache o seu caminho na vida. O conhecimento vai oportunizar uma melhor escolha profissional, onde ele vai se sentir feliz.
A filosofia diz que o homem busca a felicidade, o bem estar. E eu sempre digo que felicidade é a gente gostar daquilo que faz, e não fazer o que se gosta.
novohamburgo.org – Depois de toda essa trajetória, qual é o seu sonho de vida?
Meu sonho é conseguir fazer 50, 60 anos de casada com saúde, envelhecendo com dignidade e saúde.
Marie Traude – Sonho com a felicidade da minha família, em poder desfrutar de muito tempo acompanhando o meu marido juntos. No dia 6 de janeiro, completamos 46 de casados. Casei quase junto com o magistério e com o marido. Ele sempre me dizia: “Por que tu sempre tens que ficar pra apagar a luz da escola?”. Sempre era a última que saía, mas ele entendia. Na minha formatura, eu completava 45 anos de casada e na hora de falar eu testemunhei isso, porque eu acho que isso tem que se dizer, porque ficar 45 anos casado é uma conquista, é uma vitória. E é muito bom.
Meu sonho é conseguir fazer 50, 60 anos de casada com saúde, envelhecendo com dignidade e saúde e ver os meus netos, bisnetos, meus filhos, que já estão muito bem encaminhados profissionalmente. Eu fico muito feliz em ver como eles são pessoas de bem, e que fazem o que são apaixonados.
E em termos de educação, que foi o meu outro lado da minha vida, essa minha união com a educação, eu sonho com um Estado forte, um Estado com uma educação de ponta, como ele já foi. E isso não está na mão da secretária só, está na mão dos professores, da família, de uma sociedade inteira. Mas o professor tem que saber: não adianta fazer greve, não se recebe o salário com greve. Façam o trabalho, mostrem seu trabalho, porque com o teu trabalho a criança vai dizer: “Nossa como é boa a minha professora”. E a comunidade vai notar um amadurecimento. Sonho com o professor valorizado, com uma educação de ponta e o Rio Grande do Sul, como já foi, voltar a ser o primeiro em educação.
novohamburgo.org – Então, qual recado final a senhora deixa?
Marie Traude – Eu deixo o recado que sempre deixo nas escolas, que é uma mensagem que recebi quando saí da escola Oswaldo Cruz. É um pensamento de T.E. Lawrence, que diz mais ou menos assim: “Todas as pessoas sonham, mas não da mesma maneira. Tem uns que sonham dormindo e quando acordam tudo não passou de um sonho. E tem as que sonham acordadas. Essas são pessoas perigosas, porque podem lutar para tornar os seus sonhos realidade.”
Então, convoco nossos professores e professoras a serem pessoas perigosas.