novohamburgo.org – A orelha de seu livro é assinada por Moacyr Scliar. Como vocês se conheceram?
Cleo de Oliveira – Em 2006, eu fui o vencedor do concurso literário da Petros. Normalmente, eles fazem uma entrevista com cada finalista e colocam no livro. Nessa entrevista, quando perguntados qual escritor admiravam, quatro dos dez finalistas citaram o Scliar. Entre eles, eu.
Como todos os anos, a Petros convida um escritor para homenagear. Nesse ano, convidaram o Scliar, justamente por ter sido tão citado. Isto foi lá no Rio de Janeiro. Ele é um cara muito simples, e me senti à vontade para mandar uma mensagem perguntando da possibilidade da orelha, já que tínhamos tido um contato lá.
Lembro de uma brincadeira dele dizendo que aquilo já era quase uma nova Revolução Farroupilha (além de nós havia mais dois gaúchos finalistas do concurso). Ele aceitou sem cerimônia e, para minha surpresa, gostou demais dos contos que lhe mandei e deixou isso bem claro nas linhas que me enviou para colocar na orelha do livro.
novohamburgo.org – Como é ter o reconhecimento de um escritor como ele?
Cleo de Oliveira – Primeiro quase nem acreditei, não sonhava com tanto. Afinal de contas ele era (e continua sendo) um dos meus ídolos. Um grande escritor. Depois, veio a sensação de que estou no caminho certo e o negócio é continuar trabalhando. Ser reconhecido como escritor num país que lê muito pouco é uma coisa bastante difícil.
Qualquer um que escreve tem que ter isto bem claro, senão vai parar de escrever no segundo mês. Por isso temos que enaltecer figuras como o Scliar que é lido e conhecido em todo o país.
O Rio Grande do Sul é um estado diferente. Aqui se lê mais, se vende mais livros, se promove mais a cultura.
novohamburgo.org – Como você avalia a importância das feiras do livro na atualidade?
Cleo de Oliveira – O Rio Grande do Sul é um estado diferente. Aqui se lê mais, se vende mais livros, se promove mais a cultura. E as feiras têm grande parte nisso. Tenho amigos escritores que conheceram a feira de Porto Alegre e ficaram maravilhados. Nunca viram nada igual.
Por aqui, cada cidade faz a sua, umas menores outras maiores, mas de alguma maneira estão promovendo a literatura, o contato entre os escritores e seu público. Isto é muito importante, principalmente para o jovem que quase não encontra mais livrarias para freqüentar. O livro vai ficando mais distante do leitor, e o escritor também. A quantidade de livrarias de Buenos Aires é semelhante à quantidade de livrarias de todo o Brasil.
novohamburgo.org – Você acha que ainda existem muitas dificuldades para quem quer publicar um livro?
Cleo de Oliveira – As dificuldades são imensas. Num mercado que vende pouco, as editoras ou investem no lucro certo ou acabam quebrando. Muitos escritores optam por bancar a sua edição, mas sem um sistema de distribuição e divulgação eficientes acabam ficando à margem do público.
Tem muita gente de qualidade escrevendo no Brasil sem editar.
Iniciativas isoladas ainda promovem concursos onde o vencedor vê seu livro editado, e esta é uma das poucas chances de um escritor lançar seu primeiro livro sem ter que desembolsar. Mas são tão poucos (é o caso do concurso do Sesc, da Casa de Cultura Mário Quintana e do Asabeça, concurso que proporcionou o lançamento do meu livro) que a grande maioria dos escritores acaba não conseguindo editar.
E tem muita gente de qualidade escrevendo no Brasil sem editar. Se um dia conseguirmos aumentar o mercado de leitores, pode saber, já tem uma quantidade grande de livros de ótimos engavetados, prontinhos para serem editados e lidos. A internet, com seus blogs e sites literários, acaba cobrindo uma parte dessa lacuna.
novohamburgo.org – O que você pensa sobre a freqüência com que as pessoas buscam a leitura hoje em dia?
Cleo de Oliveira – Está muito associada com a qualidade do ensino. O prazer pela leitura vem desde cedo. Mas como despertar para isso num sistema em que mesmo muitos professores não foram incentivados à leitura e acabam não tendo o hábito?
No ano de 2006, fiquei espantando quando perguntei à minha filha quantos livros ela havia lido a pedido do colégio. Não os que ela havia lido por conta própria. Nenhum, foi a resposta. Estávamos em agosto. Uma aluna de oitava série, escola particular, em agosto não havia lido nenhum livro ainda. Até o final daquele ano ela teria de ler dois livros. É muito pouco.
novohamburgo.org – Por isto, imaginas que a mudança de cultura pode começar pelas escolas?
Cleo de Oliveira – A grande mudança para mim está no sistema educativo. Incentivo às publicações, incentivo ao uso delas nas escolas. Acho que muita coisa está mudando neste país. Mas qualquer mudança cultural como essa se processa em décadas. Acima de tudo penso que a chave da mudança está na valorização do professor. Investindo nele.
Garimpar um grande conto é uma tarefa árdua, mas compensadora, quando se atinge o objetivo. Por isso, sigo escrevendo contos.
novohamburgo.org – Quais são os próximos projetos?
Cleo de Oliveira – Como um filho pequeno, este meu primeiro livro precisa de cuidados. Então, por enquanto, minha atenção está voltada para ele. Divulgar em feiras, imprensa, crítica, etc.
Eu gosto muito do gênero conto. Não digo que nunca escreverei uma novela ou romance, até já escrevi alguma poesia, mas o conto é o que mais me fascina. Leio muito conto e pouco romance. Alguma coisa de poesia.
Admiro os escritores que dedicaram uma obra ao conto, e que conseguem escrever o tipo de conto que considero perfeito. Aquele que quando você lê, tem que dar uma parada, fecha o livro e viaja por alguns minutos. Garimpar um grande conto é uma tarefa árdua, mas compensadora, quando se atinge o objetivo. Por isso, sigo escrevendo contos.