Portal acompanhou uma incursão pelo rio que dá vida à região, mas que ainda mostra sinais de morte
Por Rafael Geyger
Foi num sábado, como este dia 27, que o Rio dos Sinos viveu o pior dos seus momentos. Era outubro, como agora, quando o rio que dá vida à região sucumbiu à ação do homem e deu seu primeiro e claro sinal de morte. Um sinal que insiste em não se afastar do nosso Sinos, amparado na inércia de uma sociedade inteira.
Fotos: Martim Pescador passeia pelo Rio dos Sinos
Com faixas negras envoltas nos braços, integrantes e amigos do Grupo Pensando Novo Hamburgo realizaram neste sábado um passeio com o barco Martim Pescador até a foz do arroio Portão, onde, em 7 de outubro de 2006, 86 toneladas ou um milhão de peixes foram mortos por um coquetel letal que incluiu irresponsabilidade de empresas, poderes públicos e da população de sua bacia.
Foi uma incursão para lembrar justamente o aniversário de um ano da maior tragédia ambiental envolvendo um rio gaúcho. O portal novohamburgo.org acompanhou este passeio cercado de surpresas e de um desafio transparecido nas reflexões que surgiam em seu curso.

Quem esteve no barco neste sábado, sob a orientação de seu comandante, Henrique Prieto, viu um rio castigado. Pedaços de sacolas plásticas, garrafas pet, retalhos de isopor e até sacolas inteiras formam um varal da falta de educação coletiva, que insiste em não dar uma destinação correta ao seu lixo.
Foi possível ver também que o que castiga o rio não é apenas o lixo, a poluição industrial ou a falta de saneamento. O Sinos está assoreado, sofrendo com a erosão, acuado diante de uma extração mineral sem critérios e da eliminação gradativa da mata ciliar.
Fundamentalmente, o rio padece diante de tudo o que é jogado para dentro dele. Mas nem isto impede o sonho de um, dois, três, diversos pescadores, amadores ou não, que arremessam seus anzóis às turvas águas do Sinos, na esperança de levar para casa um alimento ou de ter uma fonte de renda.
São pescadores que ignoram o quadro visto por quem passeou pelo rio a bordo do Martim Pescador. Ignoram talvez pelo desespero, da fome ou financeiro. Só não há mesmo o que dizer diante daquele homem franzino que pescava no ponto mais poluído de todo o rio, onde o esgoto da cidade de São Leopoldo é despejado in natura.

Ali, naquele ponto, onde o pescador busca nem se sabe o quê, o Rio dos Sinos tem um cheiro fétido, tão forte quanto o cheiro de morte que revelou a faceta mais cruel da sociedade passiva, negligente e permissiva, há um ano atrás.
O lixo nas árvores, a garrafa que bóia na água, o esgoto que enoja, o pescador que tira da água um peixe que não se entende como ainda respira. São lições de um sábado de outubro, como aquele dia 7, em 2006.

É como a propaganda da montadora de automóveis, que, numa visão futurista, expõe pessoas espantadas com o crescimento de uma planta em um vaso comum. O mesmo espanto apareceu neste sábado, nas reações de quem via uma garça, uma tartaruga ou o próprio martim pescador, ave símbolo do rio e cada vez mais rara.
Naquele vôo solo do pássaro de plumagem verde-azulada, seguindo o contorno do rio ao bater de suas asas, o martim pescador, o barco e a ave, deixou sua principal lição: o Sinos está vivo, ainda. Ele só precisa ser cuidado. Inadiavelmente.