Escritora, declamadora e uma das vozes mais queridas da poesia gaúcha, Jurema Chaves celebra 60 anos de carreira literária com a mesma emoção da menina que, aos três anos, declamou seu primeiro poema.
De Encantado ao Brasil, com paradas em Porto Alegre, Roraima, São Paulo e São Leopoldo, a trajetória da escritora, poetisa e declamadora Jurema Chaves é um testemunho de amor pela palavra. Aos três anos, subiu numa mesa para declamar seu primeiro verso; aos seis, já era estrela da Rádio Encantado. Hoje, com 18 livros publicados e dezenas de prêmios, ela se define como “uma poeta de alma inteira”, expressão que resume uma vida dedicada à arte de transformar sentimentos em versos. Em entrevista ao programa Conversa de Peso, da Vale TV, Jurema emocionou o público ao falar de suas origens, da efervescência cultural dos anos 1980 e da atual falta de espaços para a poesia em São Leopoldo.
A infância encantada de uma menina-poeta
Jurema Chaves nasceu em Encantado, no interior do Rio Grande do Sul, e desde cedo descobriu que a poesia seria sua morada permanente. “A poesia me acolhe, me abraça. Quando a tristeza me pega, a poesia me abraça”, contou.
A primeira vez que declamou foi em uma festa de Crisma, incentivada pela tia professora. “Eu tinha três anos e, quando me colocaram em cima de uma mesa, senti que jamais viveria sem a poesia”, recorda. Desde então, nunca mais abandonou os versos que, segundo ela, são sua forma de respirar o mundo.
Aos seis anos, já participava de programas de rádio como Trem da Alegria e Hora Infantil, na Rádio Encantado. “Eu ficava em pé numa cadeira para alcançar o microfone. Aquilo me fez entender o poder da palavra e do palco”, relembra, com humor e ternura.
A jovem declamadora que virou escritora
Com a mudança da família para São Leopoldo, Jurema começou a se apresentar em eventos escolares, declamando em datas cívicas e concursos literários. Inspirada por nomes como Vinícius de Moraes, Gonçalves Dias e Castro Alves, logo começou a escrever seus próprios poemas — ainda escondidos nos cadernos, guardados sob o travesseiro.
Seu talento, porém, logo foi descoberto. Durante uma apresentação em um CTG, na década de 1980, jornalistas e escritores se impressionaram com sua interpretação e a convidaram para um programa de rádio. “Fiquei lá por mais de dez anos, e o público começou a ligar dizendo que gostava da minha voz, da minha energia. Foi ali que comecei a ser chamada de poetisa”, contou.
O incentivo dos ouvintes e dos colegas resultou em seus dois primeiros livros, Buscando Horizontes e Campos da Terra, lançados em 1988 pela Editora Rottermund, de São Leopoldo.
A São Leopoldo cultural que o tempo levou
Na entrevista, Jurema Chaves relembrou com saudade o cenário cultural efervescente que viveu na década de 1980. “São Leopoldo tinha música na praça, saraus, programas ao vivo, escolas abertas à poesia. Hoje, a gente sente falta disso tudo. A cidade precisa reencontrar seu espaço para a cultura e para o artista local”, lamentou.
Foi nesse período que ela conheceu a Editora Martins Livreiro, com quem publicou obras voltadas à literatura infantil. “O seu Martins me disse: ‘quero que tu escrevas um livro para crianças’. E assim nasceu uma nova fase da minha escrita, dedicada aos pequenos leitores”, recordou emocionada.
Poesia como resistência e cura
Ao longo da conversa, a poetisa destacou que escreve tanto nas alegrias quanto nas dores. “Produzo mais na dor. Quando perdi meu filho, a poesia foi o meu consolo. Escrevi chorando — e esse poema está gravado na lápide dele”, revelou.
Jurema acredita que o mundo atual sofre de uma carência de sensibilidade e que a poesia tem papel essencial para restaurar a empatia e o afeto. “As pessoas estão carentes de amor, de espírito. O mundo está cinza. É preciso devolver cor à vida — e a poesia faz isso.”
Durante a pandemia, enquanto o isolamento silenciava palcos e eventos, ela se reinventou: escreveu, costurou bonecas, criou bolsas e tapetes, e finalizou o livro “60 Anos de Poesia”, um marco de sua trajetória artística.
Uma voz que ecoa além das fronteiras
Com 18 livros publicados e um 19º já pronto, Jurema percorreu o Brasil representando o Rio Grande do Sul em festivais e encontros literários. Foi premiada em Brasília, São Paulo, Mato Grosso, Goiás e Roraima, onde viveu um dos episódios mais marcantes de sua carreira: “Uma mulher invadiu o palco chorando, dizendo que sonhava em me ver declamar o poema com o qual se identificava. Foi um dos momentos mais lindos da minha vida”, contou Jurema Chaves.
Além de escritora e declamadora, é presença constante em palestras motivacionais, nas quais compartilha como a poesia a salvou e pode salvar outras pessoas. “A poesia é o meu colo. Ela me acorda, me faz dormir, me socorre”, disse.
A São Leopoldo que resiste pela palavra
Mesmo lamentando a redução dos espaços culturais na cidade, Jurema segue ativa no cenário leopoldense, participando de saraus promovidos por Valdir Grana e eventos apoiados pelo Sicredi, como os encontros literários no Espaço Sicredi Feitoria. “São iniciativas que mantêm viva a chama da cultura local”, destacou.
Ela também leva seu trabalho para escolas, universidades e CTGs, fortalecendo a ponte entre tradição gaúcha e literatura. “As entidades tradicionalistas são fundamentais. É nelas que a poesia continua sendo ouvida e sentida”, afirmou.
A poetisa romântica do pago
Conhecida por sua sensibilidade e lirismo, Jurema se define como uma “poetisa romântica do pago”. Já recebeu prêmios como o Rio Grande Lírico e diz que o amor é combustível de sua criação. “Eu versejo muito o amor. Mesmo quando escrevo sobre o campo, falo com lirismo. O amor está em tudo o que faço.”
Encerrando a entrevista, declamou um de seus versos mais conhecidos, “Esses Olhos”, emocionando a plateia:
“São tão profundos teus olhos, inebriados de amor,
São duas lagoas bonitas, onde duas luas benditas derramaram luz e cor…”
E completou com serenidade: “A poesia é a minha forma de viver. E se um dia lerem meus versos, encontrarão a minha alma.”
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Clique na imagem abaixo para assistir ao Conversa de Peso com Jurema Chaves no canal da Vale TV no YouTube:
Entrevista para o programa Conversa de Peso, com Rodrigo Steffen.
