novohamburgo.org – Há pessoas em Novo Hamburgo que divergem do senhor por este tipo de posição?
Scheffel – Não, não. Eles não têm informação. Eu não posso criticar isso, inclusive, porque o que fez parar foi uma falsa informação dada por uma pessoa que disse que se eu conseguisse oficializar patrimônio público eles perderiam a propriedade. Mas ela era corrupta e se deixou corromper pelas empresas.
Até hoje, as pessoas aqui, acho que não sabem que estavam sendo enganadas. Eu só soube 10 anos depois como era corrupta essa pessoa, pela pessoa que fazia os documentos. Sem eu perguntar. Mas jamais eu teria me intrometido, porque acho que nada melhor do que ser correto na vida. Ou se leva paulada mais tarde.
novohamburgo.org – E se o senhor não estiver mais aqui, quem vai cuidar da história de Novo Hamburgo, ou de Hamburgo Velho?
Scheffel – Ah, irão surgir. Acho que já está mais ou menos assegurado. Eu tenho pena que não haja essa sensibilidade. Que não tenham descoberto as vantagens, como Gramado descobriu. Gramado inventou o estilo que não era deles, a não ser por um ou outro exemplo. Isso foi muito discutido. Mas daqui a 100 anos, 200 anos, será reconhecido como autêntico.
O nosso é histórico, autêntico, só faltava escavar. Por isso, em 1983 nós lançamos o Hamburgerberg, o jornal. Mas é tudo muito assunto para uma pessoa. Construímos aquele jornal e pedimos para algumas outras pessoas, jornalistas, para nos apoiar, e agarrar firme a coisa em mãos. E esse jornal foi importante, com notícias oficiais, históricas. E há muito ainda por descobrir, naturalmente.
novohamburgo.org – Hamburgo Velho é a casa do senhor? A Itália é sua casa? O senhor é cidadão do mundo? Onde o senhor se sente mais em casa?
Scheffel – Em toda parte. Tem um título de um livro que me apresentaram: “Morar se pode em qualquer parte do mundo, basta que nos agrade. Até em um velho navio.” Agora, pelo que eu estou escrevendo ultimamente, mais eu me aprofundo na história do Rio Grande do Sul, na sua paisagem. Eu amo essa região. Eu acho que é um país assim! Auto-suficiente.
Eu amo essa região. Eu acho que é um país assim! Auto-suficiente.
novohamburgo.org – Ao voltar para cá, bate mais forte o coração?
Scheffel – Exatamente! Eu estou fortemente enraizado. Mas não posso desconhecer o passado. Por exemplo, se sabe hoje que toda a humanidade vem da África. Migramos e hoje há possibilidade de colocar a saliva numa superfície, pelo DNA e é examinada, e eles podem estabelecer em que período que você foi se transferindo até chegar aqui, adquirindo características locais.
Como diz Jeremy Rifkin, grande escritor que está na América, ele tem uma raiz judaica, mas vem da África, depois Europa e América. Tem uma fundação ambientalista. Ele disse: “Somos todos irmãos e já se sabe que não houve raças, mas etnias que conviveram mais tempo juntas, que adquiriram suas características, a parte cultural, o folclore”. Que sempre que for possível deve ser preservado. É o lado importante da mitologia coletiva.
novohamburgo.org – O senhor nunca pensou em constituir uma família? Não se sente só?
Scheffel – Eu repito o que eu disse de brincadeira: melhor só do que bem acompanhado, para quem tem muito o que fazer. Ninguém está sozinho. Sabem como eu imagino uma família? Amigos estão em crise, apresentaram problemas familiares. É como um carrossel, com o centro, que é o pai, e todos se apóiam nele.
Todos artistas me disseram: “Não te agregas, que tu não vais te realizar. É precioso o que tu tens para revelar. Não faz como nós fizemos, que estamos todos empapanados.” Palavras de Locatelli, Teixeira, bem casados, sete filhos.
Eu acho que, pela educação e pelo respeito que eu tenho pelas pessoas, é muito importante isso. Eu não admito uma convivência que não funcione, que comece a pesar.
Quando a pessoa casa, está entregue à organização social, que tem interesse de usar você.
Você sabe por que se criou o casamento? O casamento oficial é uma invenção. Então eu explico, justamente pela imagem em que começa um filme. São sete provas que uma pessoa tem que passar. No início, aparecem duas asas voando no espaço, lentamente. Então, aparecem os dizeres em que duas asas separadas vivem em absoluta liberdade. Se nós as ligamos, elas caem.
O que acontece na sociedade? Quando a pessoa casa, está entregue à organização social, que tem interesse de usar você. Você entra para o lado da servidão humana e não tem mais como libertar. Você tem de obedecer. Você não tem mais poder de escolha. Você perdeu sua independência.